Em 8 de novembro de 2022 ocorrerão as eleições de meio de mandato nos Estados Unidos, quando serão renovados 35 dos 100 assentos no Senado e todos os 435 assentos na Câmara dos Representantes. Em paralelo, ocorrerão votações em alguns estados para governadores, deputados e senadores estaduais. Do ponto de vista de nossa análise, vamos nos concentrar nas eleições nacionais, pois elas podem influenciar de forma decisiva os rumos do governo dos Estados Unidos até as eleições presidenciais de 2024, mas ainda assim traçaremos breve comentário sobre as disputas dos governos estaduais.
Tradicionalmente, as eleições de meio de mandato são vencidas pela oposição. Durante os dois primeiros anos de mandato, os presidentes encontram dificuldades para entregar aos eleitores muitas das promessas feitas durante a campanha eleitoral. Apenas George W. Bush, em 2004, conseguiu uma expressiva vitória. Naquele momento, ele contava com uma grande popularidade decorrente das guerras contra o Afeganistão e o Iraque, que se seguiram aos atentados terroristas de setembro de 2001.
Em 2022, a situação de Joe Biden é bastante adversa. Há dois eventos que impactam negativamente em sua popularidade: a atabalhoada retirada das tropas do Afeganistão, que permitiu o retorno do Talibã ao poder, e os elevados índices de inflação, que já vinham elevados desde 2021, mas que sofreram um grande impulso com a guerra na Ucrânia. De acordo com o site FiveThirtyEight, em 20 de setembro de 2022, a taxa de aprovação de Biden estava em 42,6%, uma leve recuperação frente aos 38% de dois meses atrás.
Diferentemente de outros países que possuem sistemas de competição eleitoral, em que o voto dos eleitores pode apresentar grande variação, a situação dos Estados Unidos é mais estável, pois determinados estados tendem a votar em peso em um dos partidos. Califórnia, Nova York, Nova Jersey, Washington e Massachussetts, por exemplo, são predominantemente democratas. Estados do Meio-Oeste ao Sul, como Texas, Utah, Oklahoma, Mississipi, Carolina do Sul e Tennessee são predominantemente republicanos. Esta situação é agravada pela prática difundida do “gerrymandering”, tal como discutimos aqui no Latino Observatory, em que os partidos dominantes nos estados organizam a divisão dos distritos de acordo com as suas conveniências.
Esse fenômeno faz com que as atenções se voltem para os poucos estados e distritos onde ainda ocorre alguma competição, os chamados “estados oscilantes”, ou swing states, no jargão dos Estados Unidos. Considerando as últimas eleições, este é o caso de treze estados: Wisconsin, Pensilvânia, New Hampshire, Minnesota, Arizona, Georgia, Virgínia, Flórida, Michigan, Nevada, Colorado, Carolina do Norte e Maine.
Por conta dessas características, cada partido já entra na corrida eleitoral com um a base consolidada, o que os leva a direcionar a maior parte de seus recursos para os estados e distritos mais competitivos. A título de exemplo, os democratas não colocarão muitos recursos para conquistar o primeiro distrito de Utah, que engloba a cidade de Salt Lake City, porque a população majoritariamente mórmon é partidária da pauta conservadora do Partido Republicano. O inverso é verdadeiro. Os republicanos não se veem compelidos a gastar recursos para conquistar o 11º Distrito da California, que engloba a cidade de San Francisco, uma das regiões mais progressistas do país.
A seguir discutiremos brevemente a situação dos
partidos nas disputas para o Senado, Casa dos Representantes e governos
estaduais.
A disputa para o Senado
Quando se observa a disputa para o Senado, devemos
considerar que os democratas possuem uma certa vantagem sobre seus adversários.
Enquanto estão em disputa 21 cadeiras ocupadas por republicanos, os democratas
são desafiados em 14 assentos. Com mais frentes para defender, os republicanos
correm o risco de perder um ou dois assentos nos estados da Geórgia e de
Wisconsin, de acordo com as projeções do FiveThirtyEight. Há que considerar que as posições
radicais do candidato republicano na Carolina do Norte também pioram as chances
de seu partido em obter a maioria. De acordo com a Reuters Ted Budd, apoiado ostensivamente
por Donald Trump, parece pouco empenhado em enfrentar a democrata Cheri Beasley,
que tem utilizado o tema do direito ao aborto como mote de campanha. Já do lado
democrata, apenas a cadeira de Nevada se mostra mais competitiva, já que a
vantagem da atual senadora, Catherine Cortez Mazo, possui uma pequena vantagem
sobre o republicano Adam Paul Laxalt. De acordo com o site, as chances de
os democratas controlarem o Senado é de 70%.
A disputa para a Casa dos Representantes
Diferentemente do Senado, o FiveThirtyEight projeta
que os republicanos têm 72% de chances de controlar a Casa dos Representantes. As projeções mostram que os
democratas provavelmente conquistem 207 assentos. Já os republicanos teriam
garantido 215 cadeiras. Em apenas 13 distritos existe uma disputa bastante
acirrada. São eles: 22º e 27º da Califórnia; 19º e 22º de Nova York; 7º da
Pensilvânia; 2º do Arizona; 2º do Novo México; 8º do Colorado; 17º de Illinois;
3º do Kansas; 13º da Carolina do Norte; 7º de Nova Jersey; e 2º da Virginia. A
estes, podemos incluir mais um, o 15º distrito do Texas, localizado no Vale do
Rio Grande, em que predomina a população de origem latina. A republicana Monica
De La Cruz (R), ultraconservadora e apoiadora de Donald Trump, enfrenta
Michelle Vallejo (D), que apresenta posições bastante progressistas, como a
defesa do direito ao aborto, salário mínimo de 15 dólares por hora e
assistência médica para todos.
A disputa para os governos estaduais
Dos 50 estados, 14 não terão eleições para governador.
Nestes estados, os democratas controlam seis governos e os republicanos oito. Nos
demais 36, as intenções de voto indicam que o Partido Republicano possui a maioria,
com 14 candidatos francamente favoritos e três muito bem posicionados. Do outro
lado, os democratas são fortemente favoritos em apenas 10 estados, e outros 8
em que possuem melhor popularidade do que seus rivais. Apenas o Arizona, hoje
controlado pelos democratas, apresenta uma disputa bastante acirrada entre a
atual governadora Katie Hobbs e a republicana Kari Lake.
Os latinos e as eleições
Conforme discutimos em análise do LatinoObservatory de 6 de agosto, os eleitores latinos estão sendo disputados fortemente por ambos os partidos. Os democratas já não podem contar com o apoio decidido desta comunidade. Entre 2012 e 2020, a proporção de votos democratas para presidente caiu de 61% (Obama) para 51% (Biden). A vitória de Mayra Flores nas eleições especiais no 34º distrito do Texas deu um alento aos republicanos, que passaram a investir mais recursos para obter o apoio entre os latinos.
Também no Latino Observatory de 7 de janeiro de 2022, demos destaque à pesquisa do The Wall Street Journal que mostrava a queda de popularidade do Joe Biden entre os latinos. De acordo com o jornal, “questionados sobre qual partido apoiariam se a eleição fosse hoje, 37% dos eleitores hispânicos disseram que apoiariam o candidato republicano ao congresso e 37% disseram que apoiariam o democrata, com 22% indecisos.”
Nova pesquisa patrocinada pelo The New York Times e o Siena College sobre as preferências políticas dos latinos, divulgada em 18 de setembro, mostra que em termos gerais o apoio dos latinos ao Partido Democrata continua forte, em que pese o fato de que em certos temas aumentou o alinhamento com as propostas dos republicanos. De acordo com o NY Times: “Embora a maioria dos eleitores hispânicos esteja do lado dos democratas em questões sociais e culturais, parcelas consideráveis mantêm crenças alinhadas com os republicanos: mais de um terço dos eleitores hispânicos dizem que concordam mais com o GOP sobre crime e policiamento, e quatro em cada 10 eleitores hispânicos têm preocupações que o Partido Democrata foi longe demais em raça e gênero. Os eleitores hispânicos veem as questões econômicas como o fator mais importante para determinar seu voto este ano e estão divididos igualmente sobre com qual partido concordam mais sobre a economia.”
Conforme ressaltamos anteriormente, dentre os 14
distritos mais competitivos para a Casa dos Representantes, seis envolvem
candidatos latinos nos estados da Califórnia (2), Colorado, Novo México, Texas
e Virginia. Se, de um lado, a crise inflacionária tende a prejudicar a intenção
de votos nos democratas, o tema do aborto, trazido à tona depois da derrota da
decisão Roe vs Wade, pode mobilizar o voto em favor do partido de Joe
Biden. Este é um tema que merece ser acompanhado com muita atenção. É o que
faremos até novembro.